A Paralisia do Auto-Julgamento: Desvendando Nossas Amarras Internas
Por que, afinal, não fazemos o que realmente desejamos?
De onde vêm esses julgamentos implacáveis que nos imobilizam, impedindo-nos de seguir nossas próprias vontades, mesmo quando elas estão alinhadas com a ética? A ética, como bem apontado, é um conceito multifacetado, moldado por culturas e geografias, influenciando indiretamente cada indivíduo. No entanto, não é sobre essa complexidade social que quero me aprofundar, mas sim sobre os limites que nós mesmos nos impomos.
Frequentemente, somos aprisionados pelo medo: medo da decepção, medo do julgamento alheio, medo de que algo não dê certo, um medo ilusório até de sofrer críticas. É como se construíssemos muros invisíveis ao redor de nossas aspirações, tornando-nos nossos próprios carcereiros.
Mas, de onde surge essa arrogância particular de achar que não somos dignos de uma crítica? E, o que é ainda mais problemático, projetamos a ilusão de que seremos criticados sem sequer nos permitirmos tentar executar o que estamos pensando. É um ciclo vicioso de autossabotagem, onde o potencial é sufocado antes mesmo de da ação prática ou projetada.
Realmente, nós somos os juízes mais autoritários contra nossas próprias normas e leis internas. A sentença é proferida antes mesmo do ato, e a condenação é baseada em suposições, inseguranças e ilusões.
Reflexões e Exemplos do Cotidiano
Pense na quantidade de vezes em que você quis aprender um novo idioma, iniciar um projeto pessoal, mudar de carreira, ou até mesmo expressar um sentimento a algué

m. Quantas dessas vezes a ideia foi abandonada ou sequer começou por um medo interno, uma voz que dizia: "Você não é bom o suficiente", "O que os outros vão pensar?", "E se eu falhar?".
O Sonho da Carreira Criativa: Você sempre sonhou em ser artista, mas a voz interna lhe diz: "Isso não dá dinheiro", "Você não tem talento para isso", "As pessoas vão rir de você". Em vez de pintar, você permanece em um emprego que não o realiza, justificando-se com a "segurança" ou a "responsabilidade". O julgamento não veio de fora, mas de dentro.
A Nova Habilidade: Gostaria de aprender a tocar violão, mas a procrastinação é constante. "Não tenho tempo", "Sou velho demais para isso", "Vou desafinar e passar vergonha". A imagem de um futuro "eu" falhando é tão forte que a ação presente é é deixada de lado
Expressar um Sentimento: Você sente algo por alguém, mas o medo da rejeição ou do que a outra pessoa vai pensar o impede de se declarar. A "crítica" ainda não existe, mas a antecipação dela já o cala,e muitas vezes até dói, e você não age. É como se a mente projetasse um futuro negativo tão real que se torna uma profecia autorrealizável de uma tragédia anunciada, que tem dia e hora para acontecer, geralmente assim que você se decidir a agir.
A Perspectiva da Psicologia e da Psicanálise
A psicologia e a psicanálise nos oferecem ferramentas valiosas para compreender e desmantelar essas barreiras internas.
Na psicanálise, Sigmund Freud introduziu o conceito de Superego, uma instância psíquica que internaliza as normas, valores e proibições sociais e parentais. O Superego atua como um censor interno, constantemente avaliando nossos pensamentos e ações. Quando nossos desejos entram em conflito com essas internalizações, o Superego pode gerar culpa, vergonha e, consequentemente, a inibição de nossos impulsos.
É como se tivéssemos um diretor da nossa peça teatral interna e este é implacável e morando dentro de nós, ecoando as vozes de desaprovação que um dia ouvimos, ou mesmo criando novas, baseadas em nossas próprias inseguranças. Essa censura interna pode ser tão poderosa que nos paralisa antes mesmo de darmos o primeiro passo.
A Teoria da Autodeterminação e a Busca por Autenticidade
A psicologia positiva e a Teoria da Autodeterminação, desenvolvida por Edward Deci e Richard Ryan, enfatizam a importância da autonomia, competência e relacionamento para o bem-estar psicológico. Quando nos autojulgamos e nos impedimos de buscar nossos verdadeiros desejos, estamos cerceando nossa autonomia. A necessidade de nos sentirmos competentes em algo novo é abalada pelo medo do fracasso, e o medo do julgamento alheio afeta nossa necessidade de nos sentirmos conectados e aceitos.
Pontos-Chave para Melhorarmos Nossos Próprios Julgamentos
Reconheça o Auto-Julgamento: O primeiro passo é tomar consciência de que somos nossos maiores críticos. Preste atenção aos pensamentos negativos que surgem quando você pensa em agir. Pergunte-se: "Essa voz é minha ou é uma internalização de medos externos?"
Questione a Validade da Crítica Interna: Quando a voz do auto-julgamento aparecer, desafie-a. Pergunte: "Essa crítica é baseada em fatos ou em suposições?" "Qual é a evidência de que isso vai dar errado?" Frequentemente, percebemos que nossos medos são infundados.
Desenvolva a Autocompaixão: Em vez de ser duro consigo mesmo, pratique a autocompaixão. Trate-se com a mesma bondade e compreensão que você ofereceria a um amigo. Reconheça que errar faz parte do processo de aprendizado e crescimento.
Exponha-se Gradualmente: Se o medo é grande, comece com pequenos passos. Quer escrever um livro? Comece escrevendo uma página por dia. Quer aprender algo novo? Dedique 15 minutos diários. Ações pequenas criam momentum e quebram a inércia.
Foque no Processo, Não Apenas no Resultado: Mude a mentalidade de que o sucesso é o único objetivo. Valorize o aprendizado, a experiência e o crescimento que ocorrem durante o processo. A jornada é tão importante quanto o destino.
Busque Feedback Construtivo: Em vez de temer a crítica, encare-a como uma oportunidade de aprendizado. Peça feedback a pessoas de confiança que possam oferecer uma perspectiva honesta e útil.
Lembre-se da Impermanência do Julgamento Alheio: As opiniões dos outros são, na maioria das vezes, passageiras e subjetivas. A preocupação excessiva com o que os outros pensam nos impede de viver uma vida autêntica. Como diria o psicanalista Jacques Lacan, "O desejo do homem é o desejo do Outro", mas essa "alienação" pode ser superada ao nos conectarmos com nossos próprios anseios.
Ao compreendermos as raízes de nossos próprios julgamentos e ao aplicarmos estratégias para desafiá-los, podemos nos libertar das amarras que nos impedem de viver plenamente. Qual é o primeiro pequeno passo que você dará hoje para silenciar seu juiz interno e começar a agir em direção ao que você realmente deseja?
Luciano Grenga é psicanalista, terapeuta e autor do livro "Você Não é a Sua Mente, mas Ela é Sua". Com uma formação sólida em Psicanálise (Freud, Lacan, Jung), Neurociências e PNL, ele tem ampla experiência em auxiliar pessoas a lidar com questões emocionais, promovendo o autoconhecimento e o desenvolvimento pessoal através da psicanálise.
Atendo com terapia psicanalítica presencialmente no Jardim Prudência – São Paulo, próximo à Vila Mascote, Campo Grande, Campo Belo e Jardim Marajoara, e também online para sua comodidade.
Para saber mais e agendar sua sessão, visite www.luciano.grenga.com.br ou entre em contato pelo Instagram: @luciano.grenga.